Machu Picchu: a cidade perdida dos Incas
- Virna Miranda
- 30 de jun. de 2012
- 9 min de leitura
Atualizado: 14 de dez. de 2024
A viagem para Machu Picchu começa obrigatoriamente em Cusco. É preciso passar pelo menos 2 dias na cidade para que o organismo possa se aclimatar com a altitude. Mas nossa estada em Cusco valeu cada minuto. Uma viagem para o Peru não seria completa sem conhecer esse lugar encantado.
Mas finalmente havia chegado o tão esperado dia de pegar o trem em direção a Machu Picchu. Estávamos ansiosos, e mesmo tendo que cair da cama cedinho, acordamos animados. Do hotel até a Estação de Poroy, de onde partem os trens da Peru Rail, são cerca de 20 minutos. Poroy é um vilarejo no subúrbio de Cusco, mas a estação é uma graça, limpa, moderna e organizada. Por garantia, compramos os tickets do trem ainda no Brasil, mas vi algumas pessoas comprando bilhetes na hora, pouco antes do embarque.
No foyer da estação, tem uma lanchonete onde você pode comprar snacks para a viagem que dura 3h30 até Machu Picchu Pueblo, mais conhecido como Águas Calientes. Na verdade, são apenas 97 km, mas a viagem é lenta. O trem vai devagar, serpenteando pelos trios sinuosos por entre as montanhas. Não se assuste: o trajeto não é nada entediante, e você mal vê o tempo passar.

O Vistadome, nome do trem no qual viajamos, vai fazendo um tour pelo Vale Sagrado dos Andes, enquanto você se deleita com o visual. Os vagões são confortáveis, com grandes janelas e o mais incrível: o teto também é de vidro para que possamos admirar as montanhas que cercam os trilhos dos dois lados do trem, num visual espetacular. No meio da viagem, é servido um lanche, que achamos muito legal. Um pequeno almoço, com porções de comidinhas típicas do Peru. Durante todo o percurso, o sistema de som do trem toca música andina, entremeada com uma narrativa sobre os locais por onde vamos passando. Uma viagem inesquecível!
Detalhe importante: só é permitido embarcar para Machu Picchu carregando uma bagagem de até 5kg, o equivalente a uma mochila com uma muda de roupa e itens de higiene. As malas ficam em Cusco, mas não se preocupe: todos os hotéis tem local para guardar sua bagagem com segurança e acaba sendo uma benção, porque em Águas Calientes você terá que andar até o hotel.
Águas Calientes (ou Machu Picchu Pueblo)

Chegamos a Águas Calientes às 12:20. O vilarejo está literalmente dentro das montanhas e é bem pequeno. Tem umas 4 ou 5 ruas, um rio que passa no meio meio e o trilho de trem que também corta a cidade. A cidadezinha vive 100% do turismo. A saída da estação de trem dá para um mercado de artesanato. Chegando às ruelas, você encontra muitas lojas, pousadas e restaurantes.
Aproveite para abastecer a mochila com alguns snacks antes da subida para o santuário. Muita gente opta por um bate e volta: pegam o primeiro trem do dia em Cusco, chegam no final da manhã em Águas Calientes, visitam Machu Picchu e embarcam de volta no final da tarde. Dá para fazer, mas aconselhamos o pernoite. Apesar da hospedagem ser meio salgada, é menos cansativo, você visita Machu Picchu sem pressa e ainda curte um pouquinho o vilarejo, que não deixa de ter seu charme. Esqueça táxi. O lugar é muito pequeno e se faz tudo a pé. Nos lembrou um pouco Morro de São Paulo, na Bahia, que tem meia dúzia de ruas que abrigam lugarzinhos charmosos misturados a muitos estabelecimentos improvisados, ou no bom bainês, "armengados".
Nosso hotel, o Santuário (não confundir com o caríssimo Sanctuary Lodge, que fica na entrada de Machu Picchu), deixou um pouco a desejar, mas nos pareceu melhor que muito lugar suspeito que passamos na porta. O quarto era bem simples e cheirava um pouco a mofo. Pelo que pagamos pela diária, achamos que o custo benefício não compensa muito, mas a realidade é que Águas Calientes não tem boas opções de hotel e é caro mesmo (pelo menos na época em que fomos em 2012).
Como nossa entrada para Machu Picchu era somente para o dia seguinte, resolvemos seguir a indicação da agência e almoçar no famoso Sanctuary Lodge, um hotel de luxo cuja diaria custa US 1,500.00, mas o almoço custa somente US 35. Logo descobriríamos porque... É preciso pegar o ônibus que leva montanha acima. O ponto era próximo do nosso hotel, mas nos assustamos com o valor da passagem: são S/ 45 por pessoa, ou aproximadamente US 15 ida e volta, para uma viagem de apenas 20 minutos, em um micro ônibus cheirando a poeira. A subida, no entanto, é de tirar o fôlego: a medida que o ônibus serpenteia pela estrada estreita montanha acima, vai se desvendando uma vista espetacular do vilarejo e do rio, no vale lá embaixo. Ao chegar no restaurante, uma decepção: tínhamos imaginado um lugar charmoso, com vista para as ruínas, mas no lugar, encontramos um "bandejão" entupido de turistas, com vista para lugar nenhum. Bem melhor seria ter permanecido lá embaixo passeando pela ruelas de Águas Calientes e escolher um dos simpáticos restaurantes do lugar. Mas como tudo tem um lado bom, no restaurante encontramos por acaso com nossa amiga Regina, que tinha chegado em um trem mais cedo. Almoçamos juntos e combinamos de jantar mais tarde no vilarejo.
Nos encontramos a noite no restaurante Índio Feliz, uma indicação do Lonely Planet, de tirar o chapéu. O nome é engraçado, mas acredite: foi um dos melhores restaurantes da viagem.
O lugar é lindo, tem vários ambientes com uma decoração bem colorida, no estilo "indy". A comida estava estupenda! E o melhor: por apenas S/54 (US 18), você tem direito ao menu completo, com entrada, prato principal e sobremesa. Tomei uma sopa de cebola deliciosa, depois comemos truta e torta de maçã para finalizar. Foi uma noite divertida.
Para nossa big surpresa, ao sair do restaurante estava chovendo!!! Depois de tantos dias de sol, logo na véspera de visitar Machu Picchu, chuva??? Ninguém merece... Tivemos que providenciar capas de chuva para nos abrigarmos na caminhada até o hotel e, confesso: ficamos tensos pensando no dia seguinte... Tínhamos marcado com o guia às 6h da matina, sonhando em ver o sol nascer na cidade sagrada dos Incas. Será que Pachamama iria nos receber debaixo d'água?
Uma aventura digna de Indiana Jones chamada Wayna Picchu
Acordamos às 5h. Choveu a noite inteira e parecia que a garoa fina e fria iria nos acompanhar na subida, mas tudo bem. Com chuva ou sem chuva, Machu Picchu nos esperava majestosa. Nosso guia, Horácio, nos aguardava no lobby do hotel. Vestimos nossas capas, sem imaginar o tamanho da aventura que nos esperava. Em meio a muitas nuvens, o ônibus cheio de turistas ansiosos como nós seguiu montanha acima.
Nosso tour começaria com a visita a Wayna Picchu, que em Quechua significa "montanha jovem". Até então, a única coisa que sabíamos sobre Wayna Picchu é que o acesso é reservado a parte e que somente 400 pessoas por dia podem visitar o local, em dois grupos de 200 - uma às 7h da manhã (nosso caso) e outro às 10h. Do topo dessa montanha, se tem uma vista privilegiada de Machu Picchu, a "montanha velha", mas poucos turistas se aventuram a chegar lá. Logo saberíamos porque...
Entramos na cidade sagrada em meio às brumas. A chuva fina persistia e as montanhas estavam literalmente no meio das nuvens. Parecia que estávamos no cenário do filme "O Senhor dos Anéis". A essa altura, era óbvio que ver o sol nascer em Machu Picchu não ia rolar. E o mais surpreendente é que junho é a estação seca da região. Dificilmente chove nessa época.

Seguimos Horário até o portal de entrada de Wayna Picchu, mas melhor seria dizer que estávamos atravessando o portal de um filme de Indiana Jones. Nosso guia apontou o topo da montanha comunicando com a maior naturalidade que subiríamos 450 metros por uma escadaria de pedra até o cume. E lá fomos nós...

A escadaria é toda feita de estreitos degraus, a maior parte muito íngreme. Em alguns pontos, cabos de aço ou cordas servem de apoio para dar mais firmeza na subida. Como chovia, estava tudo super escorregadio. Cada vez que subíamos mais, mais entrávamos nas nuvens. A essa altura, estávamos a quase 3 mil metros de altura.

Uma hora de escalada depois, chegamos ao cume, com pernas tremendo, joelhos reclamando, pulmões arfando e completamente encharcados.
Mas no alto, Pachamama nos reservava uma surpresa: do alto das montanhas, no meio das nuvens, um altar sagrado apontava em direção a Machu Picchu. Segundo a lenda, todos os pedidos feitos nesse local mágico são atendidos pelas divindades incas. Esquecemos o cansaço e nos rendemos ao poder da natureza e à sabedoria Inca.
Após esse momento de grande emoção, iniciamos nossa descida que duraria mais 40 minutos, com a certeza de que algo nos trouxe até aqui.
Depois de uma pausa para descansar e tomar uma cerveja no café da entrada para repor as energias, voltamos a Machu Picchu para explorar o local. A essa altura, a chuva tinha resolvido dar uma trégua e um sol tímido ameaçava dar o ar da graça. Coisas de Pachamama!!!

Machu Picchu: a cidade perdida dos Incas
Nada que você tenha lido ou ouvido falar sobre Machu Picchu pode traduzir o momento que você sai da pequena trilha e diante de você se descortina aquele cenário surreal. Uma coisa que nunca havia me dado conta em fotos que vi é que as ruínas de Machu Picchu ficam no centro das montanhas, cercadas por todos os lados por aqueles picos grandiosos. No lado esquerdo, no fundo do vale, o Rio Urubamba resplandece majestoso.

Quando chegamos de manhã cedinho, a cidade estava dentro das brumas, com uma luz turva, mágica. Agora, com a manhã avançando, a chuva havia cessado e o brilho do sol nos brindava com uma luminosidade incrível, deixando tudo mais verde e límpido.

Horácio nos contou que quando Bill Gates esteve por aqui, fez a declaração mais sábia que ele já ouviu sobre esse lugar: "Machu Picchu é a combinação improvável de matemática e magia". O projeto de engenharia dessa cidade combina um complexo sistema de aproveitamento dos recursos naturais, desde a posição do sol nos diferentes momentos do dia, a cada estação, até a água que desce dos picos nevados e é drenada por calhas e dutos cuidadosamente planejados, com a veneração e respeito que esse povo sábio tinha pelos Deuses que os espreitavam por trás daquelas montanhas.
Impossível se sentar para observar aquelas ruínas e não imaginar aqueles serem diminutos subindo e descendo os inúmeros degraus, entrando em suas casas de pedra muito pequenas e adorando Pachamama, a mãe terra, e outras divindades, em altares que se voltam para os montes sagrados.
Nosso guia nos deu uma aula incrível sobre o modo de vida dos Incas e compartilhou várias lendas que continuam sendo transmitidas através dos tempos. Na verdade, o povo que por aqui viveu não escreveu uma única linha sobre Machu Picchu. Tudo que se sabe vem de deduções de estudiosos e arqueólogos, cuja principal fonte de informação foi a simples observação dos vestígios e sinais deixados para trás pelos Incas, que ao tomarem conhecimento da aproximação dos espanhóis, incendiaram a cidade e fugiram para a selva Amazônica.
Machu Picchu foi construída no Século XV, a 2.400 metros de altitude, por três gerações de Incas. O último deles, Pachacuti, era avô de Manco Inca (aquele de Ollantaytamba), o que nos revela a profunda relação entre os sítios arqueológicos que se espalham por essa região andina. Depois da invasão dos espanhóis, as ruínas permaneceram esquecidas por séculos, até serem redescobertas em 1911 pelo inglês Hiran Birghan, que tinha ouvido falar de uma cidade perdida dos Incas.

No setor agrícola era formado por plataformas verdes, onde eram cultivados os alimentos. Já no setor urbano, ficavam as casas de moradia e o centro religioso. Em cada casinha minúscula viviam famílias formadas por 4 a 5 pessoas, que dormiam em camas de madeira e comiam no chão.

Espalhados pelo local, encontramos altares de cultos e sacrifícios, com simbolismos combinando os três animais sagrados dos Incas: a serpente, que representa o mundo inferior, a lhama, que representa o mundo físico, e o condor, que representa o mundo espiritual.

Encerrada a aula de história, Horácio se despediu de nós no ponto mais alto das ruínas, de onde se pode avistar toda a cidade.

Ficamos a sós para contemplar o lugar e deixar a mente e o espírito viajarem através do tempo, guiados apenas pela mágica do lugar mais incrível que já conhecemos.
Só nos restava agradecer aos deuses pela oportunidade única de poder ter estado aqui um dia.

Nos despedimos de Machu Picchu ao cair da tarde. Na saída, avistamos algumas lhamas que passeavam distraídas e soltas entre os turistas divertidos.
Terminada nossa visita, pegamos o ônibus e descemos a montanha a tempo de dar uma última caminhada pelo povoado antes de pegar o trem de volta para a Cusco.
Já era noite quando embarcamos. Estávamos tão cansados, que dormimos a maior parte da viagem. Para distrair os passageiros, os funcionários da Peru Rail apresentam alguns espetáculos a bordo, como apresentações artísticas e desfiles de roupas feitas de algodão de alpaca, que logo apelidamos de "Machu Picchu Fashion Week".
Ao chegamos no hotel Costa del Sol, em Cusco, uma surpresa: ganhamos um upgrade e fomos premiados com uma suíte espetacular, com direito a jacuzzi e tudo. Pedimos pizza e vinho e nos entregamos a um merecido descanso em grande estilo, depois desse dia longo, intenso e inesquecível.

No dia seguinte, pegamos um voo cedinho para Santiago, onde passamos mais um dia antes de embarcar de volta para o Brasil.
Quer saber mais sobre nossa viagem ao Peru? Leia também os posts abaixo:
Comments